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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

PROFESSOR SABE FAZER APOSTAS?-II

Não faz muito escrevi neste mesmo espaço que o professor não saber fazer apostas, referindo-me a aposta no ser humano. Na oportunidade lembrei que apostar no ser humano é também um jogo porque é repleto de incertezas. Não podemos garantir o resultado da nossa aposta, não podemos comprometer antecipadamente o produto. Pode resultar em uma completa desilusão, mas, ainda assim, precisamos apostar no ser humano. Não é feio ser decepcionado por alguém; feio é não se decepcionar por não ter investido.
Ser professor é tarefa para seres humanos. Seres que têm sensibilidade, que acreditam no outro, que investem no futuro da sociedade porque apostam agora nos jovens. Mais do que sensibilidade o professor precisa ter coragem de correr o risco de uma decepção. Uma? Não, muitas decepções. É preciso ter coragem de correr o risco de ser decepcionado a cada dia.
O ser humano é assim. Ele pensa diferente. Cada um tem os seus próprios sonhos, desejos, interesses e metas. Não existe uma fôrma. Não existe um padrão. Não há uma base canônica.
O professor é o profissional que mais precisa apostar no ser humano e é o que menos sabe e menos está disposto a apostar. No primeiro texto citei dois exemplos que ilustram o que significa apostar. Minha experiência com formação inicial e continuada de professores dá-me a garantia de que eles não sabem apostar. Essa tem sido a minha luta: convencer-me e convencê-los da necessidade de correr esse risco.
Mas, por que o professor não sabe apostar?  Há coisas na vida que se aprende pelo exemplo. O professor tem exemplo de apostas?
Não sei como se passa a formação nas outras áreas do conhecimento, mas sei que em Matemática é preocupante o que acontece com relativa frequência. Alguns professores nem consideram o aluno como ser humano. Não dão direito a voz. Não dão direito a uma explicação do conteúdo. Não dão direito a uma troca de ideias com os colegas durante a aula para desfazer algum mal entendido da disciplina.
Não dão direito a uma explicação? Sim, é isso mesmo. Vivi essa experiência e ainda ouço alunos falando que o professor X age assim. Como age o professor X? Copia o livro no quadro e depois apenas lê o que transcreveu. Pronto, essa é a explicação. Se isso é ser professor, se isso é explicar, se isso é ensinar, então qualquer um poder ser professor até de Javanês. E aquele professor que começa pelos exercícios mais difíceis, para que o aluno se convença que não sabe?
Na realidade isso é uma demonstração de falta de respeito para com o ser humano. O professor deve ser alguém que estabeleça relações entre a linguagem científica e linguagem do aluno. Deveria ser o intérprete, mas, nem sempre é.
Se é nesse contexto que se forma o professor de Matemática que vai dar aulas na educação básica, o que ele aprende de aposta no ser humano?
Como se isso não bastasse ainda encontramos professores que acreditam e defendem que devem provar para o aluno que ele (o aluno) não sabe nada. Precisa? Quando o aluno se matriculou na disciplina ele já não estava admitindo não saber? Será que o que precisamos não  é provar que conosco ele consegue aprender?
Há professores que nem ficam tristes porque o aluno reprova ou desiste. Conseguiram provar que o aluno não sabe. Há os que ficam tristes porque o aluno não aprendeu, porque o aluno não acompanhou os outros e por isso, talvez, fique com uma chance a menos. Esses últimos são os professores humanos.
Já trabalhei em locais onde alunos de outras áreas, durante o último ano do curso, falam o ano todo de formatura e participam de eventos. Os alunos de Matemática, por sua vez, ficam cabisbaixos, sem estímulo para participar de eventos porque estão desiludidos. Não se veem como vitoriosos. Sentem-se como alguém que está se formando sem saber, sem merecer. Sabem que se não decorarem o livro (que foi copiado no quadro) não conseguirão se formar. Sabem que tudo aquilo não os ajudará em nada porque ninguém estabeleceu relação entre o que ensina e a futura profissão dele. Não ouvem uma palavra de credibilidade no potencial presente e futuro dele.
Como o licenciado em Matemática pode aprender a apostar no ser humano?  Violência gera violência dizem os estudiosos da matéria.
O professor da educação básica não aposta no aluno não é por falta de vontade, é por não saber apostar. Uma aposta não é uma certeza. Não é garantia de retorno. Apostar é oferecer uma oportunidade que pode não ser aproveitada. Como o professor trabalha com o imediato, com a resposta da prova, e seus modelos não o ajudam, suas esperanças se esvaem.
Quando esse professor foi aluno como ele foi tratado? Apostaram nele? Alguém lhe disse que suas dificuldades em algumas disciplinas não representavam, necessariamente, fracasso? Foi-lhe dito que aprendizagem é um processo que estava apenas começando ali?  Quando ele se saiu mal em alguma prova, foi compreendido e estimulado ou foi humilhado?
Ficam as questões?
Campo Grande, MS, 09 de janeiro de 2012.
Antonio Sales                     profesales@hotmail.com

3 comentários:

  1. Fantástico este texto,quando estamos no papel de aluno, vemos que o professor aposta em quem já ganhou,ou seja, naqueles alunos quietos e que já tiram notas boas, difícil é apostar e acreditar naquele bagunceiro aquele que muitas vezes já começa excluído dentro de sua própria casa, acredito que uma solução pra isso seria salas de aula menos carregadas, com no máximo 20 alunos,assim poderíamos chegar ou estar mais próximos de cada um deles e quem sabe apostariamos em todos, que bom que temos professores como o senhor que ainda aposta na educação barasileira.

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  2. Parabéns pelo texto! Eu posso concordar que não é fácil apostar em algo que você mesmo não acredita! A sensação de apostar no ser humano nesse caso seria como semear na areia do deserto... A educação no meu ponto de vista durante a formação inicial não se baseava nos vínculos com o ser humano ("os alunos") e acreditar no seu potencial ao ponto de envolvê-lo nos estudos. Ao contrário, eu buscava inspirações na apresentação do conteúdo em questão e acreditava que aquile conhecimento científico por si só bastava para humanizá-los... Concordo com a abordagem desse artigo e acredito que a prática docente deve estar relacionada à essa "aposta" ...
    Cristiano

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  3. É amigos. É preciso rever a nossa formação

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