Quando um mais um é igual a quatro?
Lia um
livro de Yalon (*) quando deparei com essa estranha igualdade. Ela contava a experiência com uma paciente
com câncer de mama, já mastectomizada e com metástase. Quimioterapia e radioterapia
também estavam em curso.
Ele pretendia iniciar um grupo de terapia paciente com câncer, em estado terminal, quando essa mulher apareceu em seu consultório.
Ele pretendia iniciar um grupo de terapia paciente com câncer, em estado terminal, quando essa mulher apareceu em seu consultório.
O
psiquiatra afirma que a presença dela trouxe à tona a sua fragilidade como
terapeuta, fê-lo pensar na sua própria morte. Narrando o inicio do tratamento diz
que semanalmente se encontravam em seu consultório os quatro: ele, ela, a morte
dela e a morte dele, isto é, 1+1=4. Antes da chegada dela, ele era sozinho e se
ele a deixasse no consultório ela ficaria sozinha. Os dois juntos se
transformavam em quatro.
Penso na relação professor/aluno, penso no
meu trabalho. Penso na muitas vezes em que olhei para um aluno durante a aula e
nós dois nos transformamos em quatro. Ele, a dificuldade dele em entender, eu e
a minha dificuldade em tornar o conhecimento acessível a ele.
Tenho
dificuldades em completar a corrente da transposição didática de que fala
Chevallard: academia (produção da ciência), instituições sociais (interesses
sociais e políticos), professor e aluno.
Mais
triste ainda é quando 1+20=42. Fica pior ainda quando 1+20=50. Eu, vinte
alunos, nossas dificuldades (já mencionadas), a desilusão de alguns deles e
ainda alguns planos de desistência das minhas aulas.
Conheci a
Mônica (nome trocado de uma acadêmica muito simpática) numa turma de primeiro
ano nas aulas de fundamentos da matemática.
Sempre
procuro ser muito comunicativo em minhas aulas, procurando envolver todos no
processo, mas da Mônica eu só conseguia arrancar um sorriso. Um sorriso
simpático, mas que me intrigava. Ele me dizia gosto da sua comunicação, do seu
entusiasmo, mas não entendo nada do que dizes. Era eu, ela, a dificuldade dela,
a minha dificuldade e a tolerância dela para com a minha dificuldade (1+1=5).
Na hora dos exercícios a Mirna (nome também trocado) sentava ao lado dela e tentava ajuda-la, mas ela somente sorria (1+1+1=7). No segundo semestre ela não voltou. Soube que estava se preparando para outro vestibular.
Na hora dos exercícios a Mirna (nome também trocado) sentava ao lado dela e tentava ajuda-la, mas ela somente sorria (1+1+1=7). No segundo semestre ela não voltou. Soube que estava se preparando para outro vestibular.
Alguns
anos depois, ao visitar uma Concessionária, deparei-me com Mônica. Sorri para
ela e ela sorriu para mim. Nosso sorriso lembrava algo estranho: 1+1=5.
Aproximei-me
e quis saber como estava e o que tinha feito durante essa ausência. Formara-se
em História, tinha desenvolvido um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) com um
tema apaixonante para ela e continuava trabalhando na Concessionária.
Parabenizei-a
pelo sucesso acadêmico e pela felicidade que ela demonstrara ao me falar da formatura
e do TCC. Por sua vez ela também procurou ser simpática comigo falando que
gostava das minhas aulas pelo meu entusiasmo, minhas lições de vida durante a exposição
da matéria, meu respeito pelos alunos, mas, concluiu, eu não entendia nada da Matemática que o professor apresentava. Disse
ainda que achava graça de eu ter tanto entusiasmo com um conteúdo que não significava
nada para ela.
Encontrei com Mirna e falei do encontro com
Mônica. Mirna disse: “ela não entendia nada, mas dizia gostar das suas aulas.
Ainda hoje quando nos encontramos ela pergunta pelo senhor”.
Na vida
de um professor há situações que levam à igualdade: 1+1= muitos.
Antonio Sales
Campo
Grande, 11 de janeiro de 2014.
(*)Yalon,
Irwin D. Mamãe e o sentido da vida:
historias de psicoterapia. Rio de Janeiro: Air, 2008.
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