Depois de muito sofrer
sozinho, de passar por muitas situações profissionais que me afiguraram,
naquele momento, como desesperadoras tenho procurado aprender alguma coisa com
as outras profissões. Tornei-me um observador do comportamento humano do outro
profissional e procuro entender as “entrelinhas” da sua comunicação. Sempre que
possível entabulo conversa com profissionais de outras áreas procurando
perceber como interpretam a sociedade, como veem a educação, como veem a sua
profissão e assim por diante. Fico atendo ao que dizem, ao comportamento e, se
possível, ao quase dito.
Nem sempre consigo por
em prática o que aprendo, mas quando vou analisar uma situação que enfrentei
procuro vê-la sob diversos ângulos. Penso como agiria, em circunstâncias,
semelhantes outro profissional com outra formação.
Com os profissionais da
saúde penso que podemos aprender que:
1.
Mesmo sabendo que o paciente tem poucos
dias de vida, que a sua hora final está “marcada” e o prazo restante é curto, deve-se lutar
para mantê-lo vivo ainda que seja por apenas uma hora além do prazo “previsto”.
2.
Quando, finalmente, perceber que todos
os recursos profissionais falharam, que nada mais resta a fazer para evitar o
fim, então procurar proporcionar o máximo de conforto (ou mínimo de sofrimento)
ao paciente. Evitar que morra com dor. Quando nada mais restar para fazer ainda
é possível aliviar o sofrimento do moribundo com medicação, com palavras ou
orientando a família sobre como lidar com a situação.
3.
Quando, depois de tudo feito, o paciente
vier a óbito, então, ser capaz de permanecer sem chorar e sem perder o sono.
Isto é, aceitar as suas limitações, as limitações da ciência, as limitações
humanas e, se ficar frustrado, não desforrar a sua frustração no outro paciente
ou em quem quer que seja.
4.
Se depois de todo esforço e frustração
tiver que fazer um relatório do ocorrido dizer a verdade sem culpar o paciente,
os familiares, o hospital ou quem quer que seja. Dizer apenas o diagnóstico que
fez, o que era necessário fazer pelo paciente e o que conseguiu fez. Se faltou
algum material informar sem agredir o sistema.
Conversando longamente
certa vez com um advogado de sucesso percebi que:
1.
O bom advogado não tem uma causa, tem um
cliente. Ele tem que defender os interesses do cliente. Isso significa que como
professor devo me preocupar primeiramente com o aluno e depois com a ciência.
2.
Ao elaborar a sua defesa deve fazer o
melhor que puder. Elaborar uma argumentação sólida, bem embasada legalmente ou
em fatos, mas estar ciente de que o advogado da outra parte também pode estar
fazendo o seu melhor e que a decisão final dependerá da interpretação do juiz e
dos documentos que o outro apresentar. Logo, fazer o melhor e bem feito não é
garantia de sucesso, não significa causa ganha.
Como professores,
muitas vezes, estamos mais preocupados com a ciência do que com o aluno, com o
sistema do que com o aprendizado do aluno, com o cumprimento da ementa ou do
programa do que com a compreensão dos conceitos pelo aluno.
Quase sempre partimos
do pressuposto de que um trabalho bem feito resulta, necessariamente, em
sucesso. Ser profissional é assumir-se estar em um campo de batalha onde a
vitória nem sempre estará do nosso lado.
O Tamoio cantava: “não
chores meu filho, não chores que a vida é luta renhida; viver é lutar”.
3.A terceira lição que
aprendi com o advogado é que ele deve estar ciente de que o advogado da outra
parte não é seu inimigo, ele apenas defende os interesses da outra parte.
Aprendi também
conversando com um dentista quando tive que fazer um implante dentário.
Enquanto discutíamos o orçamento ele me informou que havia outro produto de
preço mais módico, de estética e resistência inferiores, mas que tinha a mesma probabilidade
de aceitação pelo organismo e se tudo desse certo resolveria
também o meu problema de mordida.
Ante de prosseguir o relato
aqui um incidente que julgo interessante. Encontrei, após algum tempo de
ausência, um ex-aluno do curso de matemática. Jovem, dinâmico, cheio de planos, com bom domínio de conteúdo
e, supostamente, com boa didática.
A me visualizar no
ambiente onde estava procurou-me para falar dos seus planos. Pretendia abrir um
curso de reforço de aulas de matemática e, tão confinante estava na sua técnica
de ensino, que poria no panfleto de divulgação algo mais ou menos assim: “se o
seu filho não aprender devolveremos o dinheiro”.
Ouvi-o com atenção e
falei dos aspectos positivos do seu plano, mas chamei a sua atenção para a
ousadia da sua divulgação. Disse-lhe que o seu curso lhe daria prejuízo em
pouco tempo porque quem trabalha com seres humanos não pode dar garantias.
Citei o caso do
dentista. Se eu optasse pelo material de primeira linha ele garantiria a
estética e a resistência do material, mas não garantiria a aceitação do
meu organismo. Em qualquer caso, se tudo desse certo, o meu problema
ficaria resolvido. Evidentemente que ele deu esperança, falou que os casos de
rejeição são minoria, mas não eliminou a possibilidade de fracasso na
empreitada.
Penso que a grande
lição que aprendi com os outros profissionais é essa: QUEM TRABALHA COM SERES
HUMANOS NÃO PODE DAR GARANTIAS E NÃO PODE SE FRUSTAR PLENAMENTE SE A AÇÃO
RESULTAR EM FRACASSO.
Não tem sido fácil por
em prática essas lições aprendidas, mas se alguém puder se beneficiar delas
valeu a divulgação.
Campo Grande, 11 de
outubro de 2013.
Antonio Sales
profesales@hotmail.com