Acabo der um texto de
Stephen Kanitz*. Nele o autor afirma que nós, brasileiros, “preferimos ser
obedientes e omissos do que cidadãos participantes da nossa sociedade”.
Não sei se concordo
plenamente com ele, mas sei que tenho presenciado tal cena com muita
frequência. Penso que com mais frequência do seria o ideal, na minha
perspectiva.
Não me coloco como exemplo, mas tenho me esforçado para não esperar
ordens. Quando alguém me alerta que falta algo procuro imediatamente analisar a
lógica da observação feita e, tendo-a encontrado, procuro a parceria de quem
fez para corrigir erro (se for erro), implementar ação (se for esse o caso) ou
discutir uma proposta adequada. Detesto ser escravo, isto é, só fazer o que sou
obrigado. Detesto admitir que outro mande em mim, que ele me controla. Prefiro agir em liberdade.
No entanto, parece que
Kanitz não está muito longe de ter razão quando afirma que “preferimos obedecer
e poder ‘tirar o corpo fora’ quando tudo der errado do que assumir
responsabilidade pelos nossos atos. Preferimos culpar nossos chefes pelo
fracasso das nossas instituições tão evidentes, a assumir que todos somos
solidários no fracasso. Preferimos obedecer a ter liberdade de ação”.
Tenho percebido que
muitos colegas, principalmente da educação básica, reclamam o tempo todo das
ordens recebidas, da falta de liberdade para agir, do planejamento “engessado”,
e por aí a fora. Quando sugerimos uma ação alternativa, como forma de
conquistar a confiança do gestor e adquirir mais liberdade, reagem
negativamente dizendo que não vale a pena tentar, que não há espaço. Vez ou outra encontramos algum professor que
diz: “apesar do ‘engessamento’ ainda é possível fazer alguma coisa diferente, ainda sobra algum
espaço e eu tenho conseguido”. São ilhas nesse imenso oceano ou minha visão
está enviesada?
Com relação aos alunos,
a situação não parece ser mais promissora. Reclamam dos professores que os
sobrecarregam com listas de exercícios e trabalhos, mas não estudam as
disciplinas daqueles professores que procuram estimular a autonomia deles.
Culpam o estilo de algum professor de dar excesso de trabalho, mas ficam
felizes com os pontos que obtém sob essa pressão. Encontram, nessa proposta de
trabalho de alguns professores, a desculpa pelo fracasso na maioria das
disciplinas e isso os conforta.
Essa é uma situação que
me parece estranha, que me indigna por vezes. Tenho dificuldade para entender
como um ser humano e submete a uma situação dessas. Prefiro a máxima proferida
por Jesus: “se alguém de obrigar andar uma milha vai com ele duas”. A primeira
é a milha do dever, a segunda é a da espontaneidade, portanto, da sua
liberdade. Se não podes escapar de uma situação vexatória de ser forçado a
caminhar uma milha, procure caminhar outra milha para mostrar a sua
determinação. A primeira milha é o trajeto do escravo, a segunda é sua escolha,
portanto, a da liberdade.
O conselho de Jesus,
segundo alguns estudiosos, se refere a uma prática comum nos tempo do Império
Romano. Cada soldado romano, em serviço, podia recrutar qualquer homem para
ajuda-lo a transportar a sua carga por uma milha e isso incomodava os judeus
que odiavam os romanos. Consultado sobre o que pensava sobre isso Jesus deu o
conselho que aparece em destaque.
Em outras palavras:
conquiste a sua liberdade, mostre que está disposto a pagar o preço de ser
livre. Quem não consegue a plena liberdade exterior deve, pelo menos, conseguir
a liberdade interior. Quem não pode fugir do dever, cumpra-o com determinação. Quem
não pode escolher o horário de trabalho, prepare-se para produzir o máximo no
horário que lhe foi determinado.
Se não podemos determinar
o nosso salário, podemos nos tornar dignos dele procurando determinar a nossa
prática pautando-a pela ética, liberdade e uma proposta mais progressista. Não
podendo ser um continente sejamos uma ilha, porém, uma ilha que marque
presença.
Concluo evocando Kanitz
outra vez: “Administradores
que delegam poder, terceirizam funções, empoderam funcionários, orientam
funcionários e não gritam ordens a empregados, estão na contramão da História
do Brasil.
Queremos mandões, seja
da direita militar ou da esquerda intervencionista do que uma empresa livre e
democrática onde todos os stakeholders opinam e assumem as suas respectivas
responsabilidades”.
Antonio Sales
profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 11 de agosto
de 2013.
*Administrador
pela Harvard. Ex-articulista da VEJA e professor aposentado da USP. Escreve “Artigos para se pensar” no http://blog.kanitz.com.br.
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