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domingo, 10 de março de 2013

A CONTRADIÇÃO



Convidado para falar a um grupo de estudantes, que se preparavam para o magistério nos anos iniciais, foi-me solicitado que tratasse das perspectivas de se tratar a matemática escolar de  modo a torna-la atraente.
Atendendo ao solicitado discorri sobre formas alternativas de abordar as operações e como explorar a matemática enquanto se estuda a tabuada. Propus atividades que envolveram os presentes e no final uma voz se levantou no auditório e fez um desafio: porque você não vai às escolas nos ensinar isso?
Confesso que gostaria de ter essa oportunidade. Penso que a matemática nem sempre é bem ensinada nas escolas e nas universidades. Nas escolas esse trato não muito próprio nem sempre é culpa dos professores. Eles são mal orientados e encontram um ambiente não muito propício. Nas universidades, por sua vez, predomina uma visão tecnicista da educação centrada na memorização de regras e repetição de modelos que não privilegia o entendimento.
Em minha resposta à pessoa que me desafiou falei das dificuldades para ter acesso  às escolas com uma proposta diferente. Falei que quando atuava na educação fundamental executei muitas dessas práticas, mas agora que estou em outra instituição tenho dificuldade de acesso. A escola está centrada no cumprimento da ementa  e não no aprendizado do aluno. Não aceita arriscar uma nova proposta. Os professores querem trabalhar os “descritores” e não a matemática.
Quando atuei na educação básica consegui realizar alguns projetos pessoais de novas abordagens da matemática. Fiz  porque me portava como profissional que assume a sala de aula como tal e faz o que acredita que deve ser feito independente da ementa ou de qualquer pressão que pudesse vir.
Sempre fiz “jogo limpo”. Nas reuniões de pais defendia as minhas propostas, nas reuniões pedagógicas anunciava a minha didática, combinava com os alunos e pedia a colaboração deles para as tentativas que faria.
Muitos alunos percebiam logo que minha abordagem era diferente e manifestavam verbalmente que tinham percebido essa diferença.
Recentemente encontrei uma ex-aluna do ensino médio. Não a reconheci de imediato, mas ela se dirigiu a mim e após se apresentar disse: “sempre me lembro, e comento com colegas,  que foi com o senhor que em toda minha vida estudantil fizemos uma verdadeira exposição numa feira de ciências. Não era cópia, foi uma produção nossa. Precisava lhe dizer isso”.
Nem sempre encontrei facilidade, nem sempre tive alunos abertos a novas práticas mas sempre anunciei o que pretendia fazer, quais os objetivos e lutei por um trabalho diferenciado.
Na universidade também me aventuro. Já produzimos um teorema em sala de aula com acadêmicos de primeiro ano (http://www.uems.br/semana/2010/artigos/06.pdf).
Voltando ao desafio e à explicação que dei, confesso que encontro uma contradição na vida de professor. Ele é o profissional que não se assume profissional.  Ele é o intelectual que não estuda, não ousa e que se sente eterno dependente de alguém para lhe dizer o que fazer. É o profissional da repetição, da ausência de sentido no que faz e da falta de estímulo. É o profissional que, em muitas escolas, recebe receitas prontas e se sente confortável com essa situação.
Mas encontro outra contradição nas escolas: a excessiva preocupação com a ementa. Os coordenadores pedagógicos de muitas escolas atuam mais como técnicos fiscalizadores de ementas.
A seguinte pergunta é inevitável: em escolas com essa característica como se pode inovar quando se é obrigado a um agir programado?
Nessas escolas não se perguntam sobre os prejuízos de certo comportamento  para o aluno, mas sobre os prejuízos  para a ementa. Esquecem que mais importante do que cumprir ementas é aprender. Uma ementa anual pode ser cumprida em um mês, portanto cumprir ementa não é problema. O problema é o aluno aprender.
 No meu entender a ementa é um referencial.
Antonio Sales                               profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 9 de março de 2013.

2 comentários:

  1. Não sou professor da rede estadual, porém, tenho muito contato com os professores de Física e Matemática da rede. Percebo, em nossos encontros, que todos estão angustiados com esta situação: o sistema está muito mais preocupado com o cumprimento das ementas e com a elaboração de planos de ensino, do que com o aprendizado dos alunos.
    Turina.

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  2. É uma situação muito triste, Prof. Turina. O pior porém é que o professor não tem contraproposta.

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