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terça-feira, 11 de novembro de 2014

PROFESSORES DERROTADOS NAS URNAS



Recentemente escrevi um lamento sobre os bons professores, sobre aqueles que se esforçam para, além de iniciar o aluno nas ciências, também educar, cultivar valores, induzir a um comportamento ético. O meu lamento tinha como motivo o resultado das eleições de 2014 onde, no meu entender, a sociedade havia se revelado contrária aos valores tradicionais ao votar no partido que havia traído os próprios ideais, os ideais  que tinha defendido durante décadas.  Citei algumas evidências e  uma das citadas por mim foi o tratamento dispensado aos “mensaleiros”, o que chamei de heroificação dos mesmos, heroificação dos corruptos.
Imediatamente um amigo, pessoa culta e por quem tenho grande apreço, me alertou sobre a superficialidade do meu discurso. Para ajudar a me situar no problema indicou a leitura de um livro (1) escrito por um respeitado jornalista.
Agradeço ao amigo pelo alerta. É no confronto de ideias que nós crescemos. Quando alguém se dispõe a nos alertar de algo que, supostamente,  não fizemos bem feito é porque nos respeita. Após os eu alerta fiquei com a pergunta: como fui superficial se tomei por base um fato transitado em julgado pela Suprema Corte do País e amplamente divulgado pela imprensa?
De qualquer modo penso que vale a pena conhecer outra versão da história e, a partir deste ponto, retomo o assunto tratado tendo com referência o livro indicado.
O autor, um jornalista que, segundo ele, procurou permanecer neutro durante o processo de julgamento do mensalão, nos alerta de que este foi muito contraditório e que, portanto, os “mensaleiros” talvez não merecessem a pena que receberam  ou a carga  de condenação de que foram alvo.
Estou certo de que é possível admitir que o processo tenha sido mesmo contraditório, por várias razões. Uma delas é que normalmente as pessoas que têm  experiência na vida política brasileira são suficientemente espertas para cometer erros sem deixar marcas fáceis de serem detectadas. Normalmente os corruptos são pessoas  inteligentes e têm advogados altamente habilitados. O julgamento não devia mesmo ter sido tranquilo.  
Com razão a jornalista afirmou: “Por  diversas  vezes  se  disse  que  as  provas  eram  tênues,   que  as   provas  eram frágeis”(p.15).   E continua: “Mas  o  julgamento  deixou  de  lado  empresas  e  grupos  econômicos  que  fizeram contribuições  ao  esquema,   tão  condenáveis,   do  ponto  de  vista   legal,   como  os primeiros,   pois  em  todos  os  casos  pode-se  alegar  que  se  buscava   comprar  favores  e atenções  especiais  do  governo.   A  CPMI  dos  Correios  apontou  sete  empresas  privadas que  contribuíram  com  R$ 200  milhões  para   as  empresas  de  Marcos  Valério.   Nenhum de seus executivos foi indiciado na  Ação Penal 470”  (p.17). 
Na realidade percebe-se que o esquema era mais complexo do que podemos imaginar e que se não foi fácil condenar um grupo teria sido mais difícil se tivesse tentado abarcar o todo. Se o SUPREMO tivesse tentado abarcar o todo talvez o crime teria sido prescrito sem nenhum condenado. Essa é uma conjetura minha e estou ciente que não me cabe a tarefa de julgar. Fica mais uma pergunta: por que o partido que se sentiu tão ofendido com o julgamento  dos seus pares, não exigiu, após a punição destes, que o processo continuasse?
Mas a minha decepção com o partido não se limita a esse fato isolado, embora tenha sido desencadeada por ele. O baixo nível da campanha eleitoral inaugurado pelo Ex-presidente da República, que é presidente de honra do partido, e desencadeando de  todo um processo de baixaria mostra que tenho razão para estar decepcionado. O nível baixo chegou ao nosso estado afetando o comportamento do candidato do partido, que era o meu preferido.
No meu texto eu deixava claro que a minha decepção é com o partido  e continuo decepcionado. Enumero aqui as razões com base na leitura do livro citado.
Na p. 18 o autor se reporta ao Presidente da época afirmando que:
  “O  que  o  PT  fez  do  ponto  de vista  eleitoral é o que é feito no Brasil,  sistematicamente”.
 A afirmação é inquestionável do ponto de vista da sua veracidade, porém, questionável quanto ao objetivo. Que a corrupção brasileira não é invenção do partido dos trabalhadores é evidente. O que há de decepcionante é o Presidente ter usado esse argumento para justificar o mensalão ou o envolvimento de membros do seu partido no mesmo. Ele que levantara a bandeira da moralidade deveria ter lamentado a situação, lamentado o fato do seu partido não ter conseguido romper com a corrente que herdara. Jamais usaria o fato para justificar-se. Não era exatamente isso que o seu partido se propunha a combater?
Quando o problema veio à tona ele disse que não sabia  de nada. O que é justificável tendo em vista que, como disse Kanitz certa vez, a corrupção é como um rio subterrâneo que corre sem ser visto. Portando, não é o que ele disse que está errado, é o modo como disse e o objetivo da fala. Procedeu como aquele pai que não quer se responsabilizar pelas atitudes dos filhos (que nós professores bem conhecemos) e usa essa expressão para dizer: se não vi não é da minha conta. A sucessora foi muito mais nobre do que ele. Ao estourar o problema da Petrobrás ela, embora também afirmasse não saber, se prontificou em punir os culpados que a justiça definir como tais.  Talvez seja uma resposta apenas eleitoreira, mas expressou, pelo menos oportunamente, indignação.
Mas o autor do livro continua afirmando que o “tratamento  mostra   a   manutenção  de  um  comportamento  convencional.   As autoridades  acusadas  como  corruptas  foram  julgadas  e  condenadas,   mas  se  manteve uma   postura   de  tolerância   em  relação  a   possíveis  corruptores,   que  têm  poder  para tentar dobrar o Estado a  seus interesses” (p. 17).
  Lamentável em todos os sentidos e pode-se perguntar: por que o partido, que estava no poder, ao invés de gastar energia heroificando os que foram condenados, não cobrou uma postura enérgica do SUPREMO no sentido de punir  também os outros envolvidos? Foi conveniente para ele? Abre brecha para justificar os seus erros futuros, assim como o fato de outros do passado não terem sido condenados autorizou o Presidente a  justificar ocorrido?
Estou decepcionado porque as falas não são de quem tem razão, mas de quem quer se desculpar. Não são falas de propostas, são falas de ataque. Não é um discurso de patriotismo, é uma fala em defesa do partido. Não são falas intelectuais, são falas populistas. Tenho pressentimentos de que, como disse Otero (2), estão usando a  democracia para acabar com a democracia “estratégia comum dos populistas na Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia e Argentina”.
Quanto ao autor do livro, não tenho dúvidas da sua capacidade técnica, mas questiono a sua pretensa imparcialidade.

Antonio Sales     profeslaes@hotmail.com
Campo grande, 09 de novembro de 2014.
(1)                      LEITE, Paulo Moreira. A Outra História do Mensalão: as contradições de um julgamento político. São Paulo: Geração, 2013. (E-Book disponível em: < http://www.acao470.com.br/wp-content/uploads/2013/12/A-Outra-Historia-do-Mensalao-Paulo-Moreira-Leite.pdf > Acesso em: 02 nov. 2014).

(2) OTERO, Miguel Henrique. “Bolsa Hoje, Fome Amanhã”. Veja. Edição 2398. Ano 47.  Nº 45.  05 de novembro de 2014. (Páginas Amarelas).

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