Recentemente
escrevi um lamento sobre os bons professores, sobre aqueles que se esforçam
para, além de iniciar o aluno nas ciências, também educar, cultivar valores,
induzir a um comportamento ético. O meu lamento tinha como motivo o resultado
das eleições de 2014 onde, no meu entender, a sociedade havia se revelado
contrária aos valores tradicionais ao votar no partido que havia traído os
próprios ideais, os ideais que tinha
defendido durante décadas. Citei algumas
evidências e uma das citadas por mim foi
o tratamento dispensado aos “mensaleiros”, o que chamei de heroificação dos
mesmos, heroificação dos corruptos.
Imediatamente
um amigo, pessoa culta e por quem tenho grande apreço, me alertou sobre a
superficialidade do meu discurso. Para ajudar a me situar no problema indicou a
leitura de um livro (1) escrito por um respeitado jornalista.
Agradeço
ao amigo pelo alerta. É no confronto de ideias que nós crescemos. Quando alguém
se dispõe a nos alertar de algo que, supostamente, não fizemos bem feito é porque nos respeita. Após
os eu alerta fiquei com a pergunta: como fui superficial se tomei por base um
fato transitado em julgado pela Suprema Corte do País e amplamente divulgado
pela imprensa?
De
qualquer modo penso que vale a pena conhecer outra versão da história e, a
partir deste ponto, retomo o assunto tratado tendo com referência o livro
indicado.
O autor, um jornalista que, segundo ele, procurou permanecer neutro durante o processo de julgamento do mensalão, nos alerta de que este foi muito contraditório e que, portanto, os “mensaleiros” talvez não merecessem a pena que receberam ou a carga de condenação de que foram alvo.
O autor, um jornalista que, segundo ele, procurou permanecer neutro durante o processo de julgamento do mensalão, nos alerta de que este foi muito contraditório e que, portanto, os “mensaleiros” talvez não merecessem a pena que receberam ou a carga de condenação de que foram alvo.
Estou
certo de que é possível admitir que o processo tenha sido mesmo contraditório, por
várias razões. Uma delas é que normalmente as pessoas que têm experiência na vida política brasileira são
suficientemente espertas para cometer erros sem deixar marcas fáceis de serem
detectadas. Normalmente os corruptos são pessoas inteligentes e têm advogados altamente habilitados.
O julgamento não devia mesmo ter sido tranquilo.
Com
razão a jornalista afirmou: “Por
diversas vezes se
disse que as
provas eram tênues,
que as provas
eram frágeis”(p.15). E continua:
“Mas o
julgamento deixou de
lado empresas e
grupos econômicos que
fizeram contribuições ao esquema,
tão condenáveis, do
ponto de vista
legal, como os primeiros, pois
em todos os
casos pode-se alegar
que se buscava
comprar favores e atenções
especiais do governo.
A CPMI dos
Correios apontou sete
empresas privadas que contribuíram
com R$ 200 milhões
para as empresas
de Marcos Valério.
Nenhum de seus executivos foi indiciado na Ação Penal 470” (p.17).
Na
realidade percebe-se que o esquema era mais complexo do que podemos imaginar e
que se não foi fácil condenar um grupo teria sido mais difícil se tivesse
tentado abarcar o todo. Se o SUPREMO tivesse tentado abarcar o todo talvez o
crime teria sido prescrito sem nenhum condenado. Essa é uma conjetura minha e
estou ciente que não me cabe a tarefa de julgar. Fica mais uma pergunta: por
que o partido que se sentiu tão ofendido com o julgamento dos seus pares, não exigiu, após a punição destes,
que o processo continuasse?
Mas a minha
decepção com o partido não se limita a esse fato isolado, embora tenha sido
desencadeada por ele. O baixo nível da campanha eleitoral inaugurado pelo
Ex-presidente da República, que é presidente de honra do partido, e
desencadeando de todo um processo de
baixaria mostra que tenho razão para estar decepcionado. O nível baixo chegou
ao nosso estado afetando o comportamento do candidato do partido, que era o meu
preferido.
No meu
texto eu deixava claro que a minha decepção é com o partido e continuo decepcionado. Enumero aqui as
razões com base na leitura do livro citado.
Na p. 18 o autor se reporta ao Presidente da época afirmando que: “O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil, sistematicamente”.
Na p. 18 o autor se reporta ao Presidente da época afirmando que: “O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil, sistematicamente”.
A afirmação é inquestionável do ponto de vista
da sua veracidade, porém, questionável quanto ao objetivo. Que a corrupção
brasileira não é invenção do partido dos trabalhadores é evidente. O que há de decepcionante
é o Presidente ter usado esse argumento para justificar o mensalão ou o
envolvimento de membros do seu partido no mesmo. Ele que levantara a bandeira
da moralidade deveria ter lamentado a situação, lamentado o fato do seu partido
não ter conseguido romper com a corrente que herdara. Jamais usaria o fato para
justificar-se. Não era exatamente isso que o seu partido se propunha a
combater?
Quando o
problema veio à tona ele disse que não sabia
de nada. O que é justificável tendo em vista que, como disse Kanitz
certa vez, a corrupção é como um rio subterrâneo que corre sem ser visto.
Portando, não é o que ele disse que está errado, é o modo como disse e o
objetivo da fala. Procedeu como aquele pai que não quer se responsabilizar
pelas atitudes dos filhos (que nós professores bem conhecemos) e usa essa
expressão para dizer: se não vi não é da minha conta. A sucessora foi muito
mais nobre do que ele. Ao estourar o problema da Petrobrás ela, embora também
afirmasse não saber, se prontificou em punir os culpados que a justiça definir
como tais. Talvez seja uma resposta
apenas eleitoreira, mas expressou, pelo menos oportunamente, indignação.
Mas o
autor do livro continua afirmando que o “tratamento mostra
a manutenção de um comportamento
convencional. As
autoridades acusadas como
corruptas foram julgadas
e condenadas, mas
se manteve uma postura
de tolerância em
relação a possíveis
corruptores, que têm
poder para tentar dobrar o Estado
a seus interesses” (p. 17).
Lamentável em todos os sentidos e pode-se
perguntar: por que o partido, que estava no poder, ao invés de gastar energia
heroificando os que foram condenados, não cobrou uma postura enérgica do
SUPREMO no sentido de punir também os
outros envolvidos? Foi conveniente para ele? Abre brecha para justificar os
seus erros futuros, assim como o fato de outros do passado não terem sido
condenados autorizou o Presidente a
justificar ocorrido?
Estou
decepcionado porque as falas não são de quem tem razão, mas de quem quer se
desculpar. Não são falas de propostas, são falas de ataque. Não é um discurso
de patriotismo, é uma fala em defesa do partido. Não são falas intelectuais,
são falas populistas. Tenho pressentimentos de que, como disse Otero (2), estão
usando a democracia para acabar com a
democracia “estratégia comum dos populistas na Venezuela, Nicarágua, Equador,
Bolívia e Argentina”.
Quanto
ao autor do livro, não tenho dúvidas da sua capacidade técnica, mas questiono a
sua pretensa imparcialidade.
Antonio
Sales profeslaes@hotmail.com
Campo
grande, 09 de novembro de 2014.
(1)
LEITE, Paulo Moreira. A Outra História do Mensalão: as
contradições de um julgamento político. São Paulo: Geração, 2013. (E-Book
disponível em: < http://www.acao470.com.br/wp-content/uploads/2013/12/A-Outra-Historia-do-Mensalao-Paulo-Moreira-Leite.pdf
> Acesso em: 02 nov. 2014).
(2)
OTERO, Miguel Henrique. “Bolsa Hoje, Fome Amanhã”. Veja. Edição 2398. Ano 47.
Nº 45. 05 de novembro de 2014.
(Páginas Amarelas).