Muito se fala em
melhorar a educação brasileira. Há quem compare com a China e outros países denominados “tigres asiáticos”, mas
esquecem de que a cultura é outra ( assunto para outro texto). Não se compara a
educação em culturas diferentes. Um
problema aqui no Brasil é que parece haver um acordo tácito (contrato didático,
segundo Brousseau) entre alguns professores e um considerável número de alunos.
As regras desse contrato seriam: você não precisa me ensinar desde que não me
reprove. Isto é, não precisa fazer nada mas, por favor, não se denuncie me
reprovando para não me obrigar a dizer o que aconteceu.
Outros falam em
investimentos na educação como solução para o problema. Investimentos
financeiros, evidentemente. Chegam a falar em 10% do PIB. Acontece que países
com educação de qualidade não investem isso tudo o que significa dizer que a péssima qualidade da nossa educação não
está relacionada somente à falta de investimentos financeiros. Talvez tenham sua origem nessa falta, mas não
está mais condicionada a ela.
Concordo com quem
disser que o professor deve ser mais bem remunerado, mas não creio que isso
contribua muito para a melhoria da qualidade na educação. Melhorará a vida
econômica do professor e isso é
importante, mas não melhorará, necessariamente
a educação.
Estou certo de que outros
programas devem acompanhar um maior investimento financeiro na educação, mas eu
não saberia dizer quais. Quem está perdido não sabe indicar o caminho para
ninguém. Eu estou perdido nesse labirinto chamado sistema educacional
brasileiro. Sei relacionar tudo que não funciona, mas não sei propor uma
praxeologia*. Eu mesmo tenho tantos
insucessos quantos sucessos na minha prática docente, mesmo trabalhando com
professores e futuros professores. De vez
em quando tenho ilhas de sucesso. De
vez em quando tenho alunos que me surpreendem e tenho professores que dizem
ter mudado a sua postura a partir das minhas orientações. Observe a ênfase na frase “de vez em quando”.
Quando professor da
educação básica também tive apenas ilhas
de sucesso. De vez em quando encontro um ex-aluno que me cumprimenta e diz que
deve o seu sucesso profissional à
influência que exerci na vida dele. Mesmo assim, muitas vezes, tenho dúvidas se
ele vem me agradecer ou apenas anunciar
o seu sucesso.
Não tenho nada contra
alguém vir anunciar o seu sucesso.
Aliás, o fato de vir anunciar exatamente a mim indica especial
consideração para com a minha pessoa. Sinto-me orgulhoso. Agradeço sinceramente
a todos que já fizeram isso. Minha dúvida é: contribuí para o seu sucesso ou
apenas não atrapalhei? Ele veio dizer-me: obrigado por ajudar-me ou obrigado
por não atrapalhar?
Lembro-me de apenas três
casos que não deixaram dúvidas quanto à minha contribuição. Um deles foi meu
aluno por um ano e aguardou, segundo ele, uns 15 anos para me reencontrar e
agradecer. Havia, segundo ele ainda, avisado a esposa que tinha essa
necessidade de se encontrar comigo. O outro foi meu aluno por um dia e voltou
15 dias depois (nas palavras dele) somente para me agradecer. O terceiro nem
foi meu aluno. Minha contribuição foi indireta e eu o conheci no dia em que me
procurou para agradecer. Ajudei-o com um conselho dado à sua mãe que já não
sabia mais o que fazer com os insucessos escolares do filho. Como se pode ver, de
vez em quando eu acerto (ou apenas não erro totalmente?).
Exatamente por não ser
um professor de muito sucesso é que me atrevo a fazer críticas ao nosso
trabalho e aos discursos que ouço por aí. Se fosse totalmente bem sucedido
seria deselegante criticar os colegas e se fosse sempre malsucedido já teria desistido da
profissão, logo, não estaria perdendo tempo com esse assunto.
Deixem-me agora falar o
que penso sobre a questão da necessidade de altos investimentos para melhorar a
educação, sem um plano previamente elaborado para um bom aproveitamento desses
recursos.
Mais
verbas não melhoram a educação porque não motiva o aluno a estudar, não o
obriga a cumprir as tarefas escolares,
não o torna mais respeitoso para com o professor e não ensina ao professor sobre o que falar
aos pais nas reuniões de pais e mestres. Essas reuniões são uma chatice.
As reuniões com os pais são uma chatice porque
os professores se limitam a parabenizar os filhos de uns e a denunciar os
filhos dos outros. Dizem para o pai tudo o que o filho dele não faz, mas não
acrescentam nenhuma sugestão, não propõem nenhuma parceria. Dizem tudo o que o
pai já sabe, mas não dizem o que ele precisa saber.
Eu
imagino o pai ouvindo as reclamações do professor e pensando: tudo isso eu já
sei. Só não sei o que fazer. Alguma sugestão?
Acompanhei um grupo de professores através de
um projeto de extensão e no final do ano
pedi uma avaliação oral. Um professor disse: “este ano consegui fazer parcerias
com os pais de alguns alunos-problema. Ajudou bastante”. Uma professora disse: “estou
mais livre, estou conseguindo administrar os conflitos da sala de aula com mais
liberdade”. Ilhas de sucesso. Outros professores sequer entenderam ou não
quiseram entender a minha proposta. Tive sucesso ou insucesso?
O
professor reclama o tempo todo mas não
apresenta propostas novas, não fala de seus novos planos, das suas novas
leituras, das novas teorias que conhece dos objetivos da sua disciplina e de como
ela pode contribuir para melhorar a qualidade de vida do aluno. É como um “canoeiro”
que não sabe remar. Reclama de ser levado pela correnteza, mas não aciona o
remo para diminuir a velocidade ou mudar
o rumo.
Lembremos
que o dinheiro compra o alimento, mas não compra a fome; traz conforto mas não traz satisfação
profissional; compra o livro mas não compra o prazer de ler e a inteligência.
Quando o
corpo docente vai para alguma luta promovida pelo sindicato sempre reclama de várias coisas, mas depois tudo se
reduz ao salário. Só pensam nisso? Ninguém pergunta ao promotor da infância e
da juventude ou ao conselho tutelar o que fazer com o aluno que se recusa participar
da aula, desenvolver as atividades propostas, que não faz tarefas, que
desrespeita o professor. Ninguém pergunta o que fazer com os pais que não
comparecem às reuniões e não justificam. Pode cortar vale renda ou
bolsa-família?
O que
fazer com o professor que passa anos a fio sem apresentar uma nova proposta de
trabalho? Continua ganhando o mesmo salário que os
outros?
Ninguém
pergunta como o gestor pode ajudar. Quais as propostas que ele tem para
diminuir esse fosso sem sobrecarregar ainda mais o professor? É fácil levar uma
carga pesada quando se tem alguém para transportá-la e sobre o qual se joga
toda responsabilidade e toda culpa se o fardo se romper.
Por outro
lado, se o professor não tem contraproposta, como dialogar?
O que
fazer com os pais que já perderam o controle sobre os filhos? Para onde
encaminhar uma criança que já adoeceu socialmente e está infectando as outras?
Não é um
labirinto? Por onde começar a melhoria da educação? Basta dinheiro ou precisa
de algum projeto especial. Por que não uma proposta de educação especial para o
aluno que já contraiu a doença socioinfectocontagiosa**?
Por que não uma forma de “obrigar” os pais virem à escola participar da
educação dos filhos? Por que não uma cartilha para ensinar o que professor deve falar aos pais nessas reuniões?
Antonio Sales profesales@hotmail.com
Nova Andradina, 21 de setembro de
2012
(*) Uma prática racional, eficaz.
(**) Drogadição, desinteresse pelo estudo, agressividade.
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