Zabala(*), escreve
que o ensino formal está centrado em conteúdos cognitivos e, de forma muita
explícita, afirma que esse conteúdo é constituído de certos saberes
tradicionais.
No campo da
matemática ainda hoje se ensina fração como se ela fosse essencial à
sobrevivência do sujeito ou necessária à sua intelectualidade. Gasta-se um
tempo considerável ensinando racionalizar frações como se necessário fosse para
entender outros conteúdos ou como se uma fração irracional não fosse número. O
verdadeiro sentido de se proceder a racionalização não é discutido nem nos
cursos de graduação, mas ela é ensinada no nível fundamental de forma mecânica
e como uma obrigatoriedade. É como se o intelecto fosse mais o importante
da vida e como se os alunos não tivessem corpo, vizinhos, irmãos, amigos, etc.,
e até alguns conflitos para serem administrados.
O próprio Zabala
discute a necessidade de se aprender conteúdos atitudinais. Esse termo não é
estranho à maioria dos professores, estranho é o processo de ensino desses
conteúdos. Sempre que se fala sobre eles percebe-se no olhar do professor um
vazio que interroga: como?
Alguns chegam a
pensar que isso é tarefa dos pais. É certo que cabe a eles parte dessa tarefa,
mas a escola tem também o dever de ensinar esses conteúdos porque é ali, na
sala de aula e no pátio da escola, que o aluno tem contato com uma maior
diversidade de pessoas e com os conteúdos formais. Ali, no espaço escolar, ele
vive uma dimensão mais ampla dos seus relacionamentos interpessoais e
intrapessoais. É nesse espaço que mais se faz necessário discutir e ensinar
conteúdos atitudinais.
Uma atitude
necessária e talvez a primeira que o professor deve ensinar está o gosto pelo
estudo, em seguida vem o respeito pelo outro, a valorização do espaço escolar,
e assim por diante. O olhar vazio do professor, quando se trata desse assunto,
tem razão de ser. É difícil ensinar o que não se sabe. É difícil imaginar um
método de ensinar o que não se aprendeu. Ensinar o que sabemos já não é fácil,
imagine termos que ensinar o que não sabemos. O professor gosta de ler, de
estudar, de conversar sobre temas científicos? Se não gosta não conseguirá
ensinar o aluno a gostar. O professor valoriza o espaço escolar? Como poderá
ele ensinar o aluno a respeitar esse espaço? O professor respeita o aluno (aqui
respeito tem uma dimensão mais ampla do que o sentido que lhe é atribuído normalmente),
o pai do aluno, os colegas? Como poderá ensinar respeito ao outro? Se o
professor, mal e superficialmente, sabe o conteúdo cognitivo como poderá
ensinar outra coisa? Se ele apenas sabe repetir o que está no livro, sem
questionar a pertinência do que está ensinando e, muito menos, sente-se capaz
de discutir o significado histórico e social do que faz, como pode ensinar
conteúdos atitudinais? A insegurança do professor, a sua falta de preparo para
por em pauta questões como: qual o sentido do que faço? Para que serve isso que
faço, além de garantir o meu sustento? Haverá algum prejuízo para o aluno, e se
houver prejuízo qual a ordem desse prejuízo, se ele não aprender esse conteúdo
que estou ensinando? E outras questões mais. .
Essa incapacidade de se incomodar com isso o
tornam inapto para ensinar atitudes. Outra condição necessária para ensinar
atitudes reside na capacidade de acreditar no potencial da maioria dos seus
alunos para serem pessoas de bem e se tornarem bons cidadãos. Zabala fala de
que ele precisa acreditar "sinceramente" no potencial do aluno para
sentir-se livre para investir nele.
Para ampliar a
discussão sobre o ensino da matemática em sua forma menos recomendada pode-se
destacar que além de centrarmos no ensino de conteúdos cognitivos, dentre eles
focalizamos os conteúdos factuais e procedimentais. Somos peritos em definir e
exigir que memorizem toponímias e técnicas de resolução, mas temos dificuldades
para discutir conceitos e princípios.
Antonio Sales profesales@hotmail.com
Dourados, 10 de agosto de 2014.
(*) ZABALA, Antoni. A pratica educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2008.
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