Recentemente participei
de um curso à distância. Durante o mesmo foram propostos vários temas para
discussão on line. Em determinado
momento um colega afirmou que um dos problemas da educação brasileira está no
fato de não ser estimulada a competição. Discordei dele dizendo que era a favor
da meritocracia (valorizar o mérito), mas não da competição.
Como o colega não
respondeu à minha provocação fiquei sem saber se ele concordou, se não entendeu
a minha posição ou se achou que eu estivesse apenas querendo ser contra dizendo
a mesma coisa com outras palavras. Fiquei pensando: e se alguém disser que
mérito e competição são sinônimos ou têm uma relação tão estreita que são
indistinguíveis?
Enquanto pensava nessas
coisas recebi a revista Veja (Edição 2347, ano 46, no46, de
13/11/2013) e nas páginas amarelas li a frase: “Quanto mais competição,
melhor”.
A entrevista é com o Dr
César Camacho criador da Olimpíada de Matemática que afirma também que “quem
não gosta de sistemas que premiam o mérito, em geral, sabe que não reúne as
condições para se sair bem”. Fiquei perplexo! Será que mérito é inseparável da
competição? Falar em mérito é o mesmo que falar em competição e vice-versa?
Continuo pensando que
não. Ainda penso que mérito e competição não são, necessariamente,
complementares ou iguais.
Por exemplo, se meu
amigo é um excelente marceneiro, tem preço compatível com o poder aquisitivo da
região e atende bem os seus clientes ele tem mérito. Se eu resolvo abrir uma
marcenaria nas proximidades serei seu concorrente (estarei competindo), mas se
eu abrir uma oficina mecânica e me tornar excelente profissional, com preços de
serviços compatíveis com o poder aquisitivo da região e atender bem os clientes
também terei mérito sem estar competindo com o meu amigo.
Mais um exemplo: se
numa cidade dois médicos, um cirurgião e um anestesista, fizerem uma parceria
para aperfeiçoar o atendimento à população eles terão mérito, mas não estarão competindo
entre si.
Por outro lado, a
competição pode não ter relação com mérito. Duas pessoas mal intencionadas
podem competir entre si para ver quem defrauda mais. Há competição, mas não há
mérito.
No caso da educação
penso que é possível falar em meritocracia sem falar em competição. No caso da Olimpíada de Matemática,
pode-se muito bem falar em mérito sem falar em competição. Pode-se premiar o melhor em Matemática sem
com isso dizer que ele é melhor do que o outro. Até mesmo porque o outro que
tirou em segundo ou terceiro lugar em Matemática pode ser melhor cidadão ou o melhor
em Biologia, por exemplo. O bronze em Matemática poderia ser ouro em Química se
houvesse olímpiada dessa ciência.
Mas, pensando no
magistério, sabemos que um professor pode ser
um “show“ nas aulas de Matemática e por isso ser apreciado pelos alunos
e admirado por todos enquanto o outro é mestre em orientar os pais na educação
dos filhos nas reuniões de pais da escola. É ele quem consegue aproximar os
pais da escola e vice-versa fazendo surgir uma parceria produtiva criando,
inclusive, um contexto favorável ao “show” do outro. Ambos têm mérito e podem
ser bons parceiros de trabalho, sem competição.
Penso que o sistema não
precisa estimular a competição, mas sim valorizar o mérito. Estimular
iniciativas diversificadas no contexto escolar e avaliar o mérito de cada
iniciativa. O que não pode é pagar todos, quer se empenhem quer não, com o
mesmo salário, com os mesmos incentivos. Nem mesmo pode nivelar a todos por
baixo.
Há muitas formas de ser
um bom professor, de contribuir para uma boa educação e todas essas ações têm
mérito. O que não vale é ficar procurando culpados para justificar a baixa
produtividade, encolher-se para nada fazer além do mínimo obrigatório,
trabalhar 60 horas por semana como desculpa de que não tem tempo para fazer
melhor ou então não trabalhar com a desculpa de que todos ganham o mesmo
salário. Para quem trabalha 60 horas o sistema poderia propor que apresentasse
um projeto relevante para ocupar as 20 horas extras que trabalha. A não
apresentação do projeto o isentaria do direito de se desculpar pelo baixo
rendimento ou falta de compromisso com a escola. O que acontece é que em alguns
lugares o mérito está na quantidade de horas passadas no local de trabalho e em
outros não há mérito em nada.
É mais difícil premiar
a meritocracia do que a competitividade. Na competitividade leva-se em conta um
único critério e na meritocracia, vários.
O futebol é um exemplo de competividade. O
critério é o número de gols. O melhor jogador é aquele que marca mais gols. A
defesa que evita a invasão do adversário não tem mérito, não é aplaudida. O futebol é injusto. Não queremos um modelo
injusto para a educação.
Na política partidária
há competição. Algumas vezes a politica brasileira é injusta, ridícula e
vergonhosa exatamente por ser competitiva. Se tivéssemos uma política, e consequente
gestão pública, centrada no mérito muitos projetos iniciados na gestão anterior
teriam continuidade ainda que o gestor fosse do partido adversário. Muitas
propostas do executivo seriam aprovadas (ou rejeitadas) no legislativo ainda
que ele tivesse minoria (ou maioria) e independente de contrapartidas de cunho
pessoal. Mérito não é competição.
Estamos cansados de
injustiça. Queremos a valorização de quem trabalha e por trabalho estamos
entendendo compromisso, envolvimento, participação em debates sobre os
problemas da educação, apresentação e desenvolvimento de propostas relevantes.
Enfim, trabalho é transpiração.
Tenho duas experiências
concluídas de trabalho em equipe que produziram bons resultados. Não havia
competição entre nós, havia parceria e compromisso. Havia o desejo de fazer o
melhor. Uma ocorreu, faz algum tempo, quando trabalhei como técnico na
Secretaria de Educação de uma grande cidade deste Estado. A outra é recente e
ocorreu em duas ocasiões em que orientei os estágios de Matemática e de Segunda
Licenciatura. Uma terceira está em andamento na produção de trabalhos de
pesquisa em grupo.
Penso que são trabalhos
de mérito sem competição. Há cooperação, envolvimento. O mérito é de todos.
Na competição um ganha
e os outros perdem. No estímulo ao mérito todos podem ganhar. Na competição
estimula-se o individualismo. Na meritocracia, a cooperação.
Antonio Sales
Nova Andradina, 15 de
Novembro de 2013.
Estava no Barra Shopping no rio de Janeiro na livraria da Travessa e peguei a revista Veja da semana pra dar uma olhada e li parte da entrevista das páginas amarelas; comentei com a Lídia o Sales precisa ler este texto é sobre matemática; acabei esquecendo e agora ao ler o seu artigo, você abre o texto se referindo às respostas do entrevistado sobre competição e mérito. Suas proposições de reflexões e diferenciações sobre meritocracia e competição são plausíveis. Acrescentaria, lembrando aqui de leitura que fiz há alguns anos do livro " 7 hábitos da pessoas altamente eficazes" do Covey, que a competição nos leva a posturas reativas, enquanto a cooperação nos faz ser proativos.
ResponderExcluirGenival
Olá Genival
ResponderExcluirQue bom que você achou plausível.
Abrigado por sua contribuição